domingo, 13 de maio de 2012

Abolição amiúde não!



Abolição amiúde não!

Vamos abolir a quietude

Vamos praticar nova atitude

Potencializar nossa virtude

Interferir na concretude

Com ações, alcançar vicissitude

Para finalmente desfrutar da juventude

Viver igualdade em plenitude

E poder gritar, em todo lugar:

Amo minha negritude!

sábado, 5 de maio de 2012

O que me falta?


O que me falta?


Sei que me falta
Músculos na calda,
Carcaça mais alta,
E envergadura.


Melhora no porte,
Moedas no pote,
Tríceps mais forte,
Melanina sem mistura.


Mas nunca faltou ternura,
Beijo com gosto de rapadura,
Ou qualquer remédio pra sua cura.


Nunca faltou vontade
Ou desejo de minha parte.
Mas o beijo que arde...
O toque que arrepia
Senti uma ou duas vezes, nesse ou naquele dia.


Aí doeu.
A torre forte estremeceu
Na formatura, quem dançou fui eu.
E na estreia, o papel de bobo, adivinha: Foi meu!


Normal... eu tenho espelho
Essa mulher aí de vermelho...
Vestido... Baton...
Sorriso fácil, suave som...
E um calor tão bom...
Hummm... acho que não.
Que pena que não.
Não!



quinta-feira, 3 de maio de 2012

STF, Cotas e o caminho racista das pedras



STF, Cotas e o caminho racista das pedras

O resultado do julgamento de Cotas e das Ações Afirmativas pelo STF, nos dias 25 e 26 de Abril em Brasília, não foi obra do acaso. Ao contrário, nos custaram vidas e muitos anos de luta. Para além da resistência ancestral nos séculos de escravidão e no pós-abolição, nos últimos dez anos as cotas foram alvo de uma covarde campanha promovida em conjunto pelos grandes meios de comunicação do país, tendo como atores parte importante das elites políticas, intelectual e artística, quando podemos destacar:

Os Deputados Bolsonaro “pai” – federal – e “filho” – estadual –, que além de árduos defensores da ditadura de 64, ocuparam a linha de frente na batalha contra cotas (http://migre.me/8UHjs) em Brasília e no Rio de Janeiro;

O latifundiário Ronaldo Caiado (DEM), que protocolou pessoalmente uma tentativa de impedir a realização da Audiência Pública sobre cotas, promovida pelo STF, em março de 2010 (http://migre.me/8UGz2). Audiência Pública na qual o hoje afogado em “cachoeiras”, Demóstenes Torres (Ex-DEM), sugeriu que as relações sexuais entre mulheres negras e seus senhores seriam “consensuais” (http://migre.me/8UGPn), além de responsabilizar os próprios negros pela escravidão (http://migre.me/8UGSD);

Os acadêmicos Yvonne Maggie, Peter Fry e Demétrio Magnoli – este último, crítico da instalação da Comissão da Verdade e defensor da apuração de crimes cometidos por grupos terroristas que se levantaram contra a ditadura de 64, tal como registrado em sua participação no documentário “Reparações” (http://migre.me/8UHrA);

Ali Kamel, diretor de Jornalismo da Rede Globo de televisão, autor do Livro “Não Somos Racistas”, que chegou a expor sua obra em horário nobre, em cena da novela “Duas Caras” (http://migre.me/8UL7n);

O poeta Ferreira Goulart e o Cantor Caetano Veloso (ironicamente, autor da música “Haiti”), que entre outros artistas, assinaram o Manifesto Contra Cotas (http://migre.me/8ULef);

Até mesmo nas ciências genéticas foram buscar argumentos para combater a política de cotas, quando a partir dos estudos de Sérgio Pena, afirmou-se que o sambista Neguinho da Beija-Flor seria geneticamente mais europeu do que africano (http://migre.me/8ULx8).

Nesse mesmo período de longa batalha, movimentos negros, ong’s, grupos estudantis, intelectuais e também políticos e artistas se dedicaram incansavelmente no sentido de garantir os avanços para a população negra. E graças a essa militância, experiências de Cotas para negros lograram êxito e demonstraram na prática a sua eficiência, quando comparada aos métodos universalistas e tradicionais. Uma das grandes mobilizações aconteceu em São Paulo, no dia 6 de Março de 2010, um dia depois do encerramento da Audiência Pública sobre Cotas, promovida pelo STF em Brasília. Mais de 500 estudantes se reuniram para uma grande Aula-Pública em defesa das Cotas (http://migre.me/8UFnK), seguida de uma passeata pelas ruas do centro de São Paulo (http://migre.me/8UFjA).

O julgamento do STF que confirmou por unanimidade, num placar simbólico (10 a 0), a constitucionalidade das cotas, foi um duro golpe para as elites racistas do Brasil. Mas qual a motivação para que a nata da burguesia e da velha direita tenham se empenhado tanto em derrotar as políticas de cotas para negros em universidades? No fundo, o debate sobre cotas revelou a forte dimensão racial da luta de classes no Brasil e nos serviu para levantar a poeira que expõe o posicionamento conservador e racista das elites brasileiras, muitas vezes compartilhado por setores ditos progressistas e partidos de esquerda.

A partir do fôlego que alcançamos com a vitória do STF, precisamos acumular forças, formar mais e mais ativistas, provocar naqueles que conseguimos reunir a dúvida, a interrogação em relação às desigualdades, ao racismo, à homofobia, ao machismo, à precariedade da educação pública e tantos outros temas. Ao mesmo tempo precisamos movimentar os corpos, precisamos fomentar a cultura do protesto, da prática da reação e isso só se dá através de a uma militância ativa. Os grupos de militantes negros, de todas as organizações do movimento negro, precisam voltar para a rua. Precisamos de um movimento negro que faça trabalho de base permanente, que deixe um pouco de lado os gabinetes, os palanques e os camarotes e volte para as ruas, para o fomento da rebeldia negra.

Nas palavras do Ministro Ayres Britto, presidente do STF, quando do encerramento do julgamento histórico, “o Brasil ganha (...) um motivo para olhar para o espelho da história e não corar de vergonha”. De onde estamos, sabemos que ainda há muito do que se envergonhar no Brasil, em especial no que diz respeito às desigualdades sociais que atingem a população negra. Mas essa batalha nós vencemos! Seguimos com armas mais poderosas. Agora, é transformar a vitória jurídica em prática revolucionária.





Douglas Belchior
Professor de História e Sociologia da Rede Pública Estadual de SP
Membro do Conselho Geral da UNEafro-Brasil
Facebook: Douglas Belchior

STF e Cotas: Um precedente para a Utopia



STF e Cotas: Um precedente para a Utopia

O Julgamento da constitucionalidade das Cotas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) enterrou os argumentos daqueles que, nos últimos anos, militaram incansavelmente na tentativa de impedir a conquista e ampliação de direitos da população negra brasileira. E mais que isso: as análises dos Ministros colocaram a centralidade da questão racial como estruturante das desigualdades sociais no Brasil. Mais que um precedente jurídico fundamental para o avanço de novas legislações que visem a reparações históricas, a defesa e a decisão pela constitucionalidade das cotas formulada a partir da mais alta corte de Justiça do país é a conquista de um precedente para a utopia.

No entanto, embora represente uma grande vitória e, com certeza, a inauguração de um novo patamar para a luta antirracista no Brasil, a decisão do STF tratou-se de mais uma batalha apenas. A guerra contra o racismo e as desigualdades sociais de maneira geral está longe de ser vencida. Não há um desencadear de efeitos práticos imediatos a partir dessa decisão. Este histórico acontecimento deve servir ao Movimento Negro como combustível para mobilização e luta por avanços reais.

É sempre bom lembrar que oferecer igualdade de condições não significa nada se, paralelamente, não for garantida a igualdade no acesso às oportunidades. Há ainda pela frente uma dura batalha contra o racismo e seus estigmas, que ainda fazem os negros serem barrados e/ou hostilizados nos diversos espaços de sociabilidade, sobretudo no mercado de trabalho. A escola como um todo ­– em especial a universidade, que pode estar prestes a se abrir para a diversidade – tem o dever pedagógico de ajudar a criar uma nova mentalidade na qual a cor da pele e as características físicas não estejam relacionadas a qualidades morais.

Neste sentido, há de se questionar, ainda a partir dos pressupostos jurídicos, políticos e históricos, proferidos pelos senhores ministros do STF, a efetividade da Lei 10.639/03 ou do Estatuto da Igualdade Racial, que trazem em si muito mais valor simbólico do que uma efetiva garantia de diretos ou uma mudança real para a vida da população negra do Brasil.

O momento também é oportuno para se questionar e impor limites ao caráter letal ou excessivamente repressivo das abordagens policiais, cujo alvo preferencial é a juventude negra. O número de homicídios cometidos por policiais contra essa parcela da população é de proporção três por um, se comparado aos não-negros. Isso quando não é, “por sorte”, encarcerada em penitenciárias e internatos em condições sub-humanas. Drogas, desemprego, precariedade de moradias e das condições de saúde, como bem sabemos, atingem também de maneira especial esse grupo específico. Isso tudo fruto de uma história de violência e opressão que só poderá ser minimizada a partir de políticas de reparação histórica, debate esse que o Estado Brasileiro – estruturalmente racista – jamais se propôs a fazer.

Incentivo para lutar mais!

Não se pode perder de vista o fato de a decisão do STF não obrigar, mas apenas autorizar as universidades a implantarem programas que busquem reduzir ou até mesmo eliminar as desigualdades raciais. Sob o argumento da autonomia universitária, as instituições mais elitizadas continuam com sua postura arrogante e subserviente aos interesses da classe dominante. Em São Paulo, por exemplo, as três maiores universidades (USP, UNESP e UNICAMP) já declararam a impossibilidade da adesão às cotas por sua própria iniciativa (http://migre.me/8UI0x). No máximo, utilizam de subterfúgios frágeis no sentido de formular “alternativas” para o acesso de camadas excluídas aos bancos universitários, tais como o Inclusp e outras iniciativas que comprovadamente resultam em efeitos nulos ou irrelevantes.

Assim, não há alternativa, senão a pressão popular. Um primeiro alvo dessa mobilização deve ser a retomada da campanha pela aprovação do PL 180/2008 (http://migre.me/8UHEQ), que prevê cotas para estudantes de escolas públicas, pobres e negros em universidades públicas. O projeto segue engavetado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado. A partir da decisão do STF não há justificativa para que o projeto não seja aprovado pelas casas legislativas e sancionado imediatamente pela presidenta Dilma. A conquista desse precedente jurídico deve nos servir também para embasar ações no sentido de, por exemplo, alcançar a mesma vitória no que diz respeito à constitucionalidade do decreto 4887, questionado pela ADI-3239, também do DEM, que tenta impedir a titularidade dos territórios quilombolas.

Ao confirmar a constitucionalidade das cotas e das ações afirmativas da maneira contundente – no placar e no conteúdo das justificativas -, como foi, se desenhou a contraditória situação: A voz da justiça burguesa e conservadora dirigida ao estado e seus pares dizendo: “Iniciativas e regulamentações que visam garantia da presença negra em universidades, no mercado de trabalho e nos espaços de poder são legais, morais  e legítimas. E todo o seu contrário é fruto da herança escravocrata e racista.” Com a palavra, reitorias, conselhos universitários e o parlamento brasileiro.

Douglas Belchior
Professor de História e Sociologia da Rede Pública Estadual de SP
Membro do Conselho Geral da UNEafro-Brasil
Facebook: Douglas Belchior